sábado, 26 de junho de 2010

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Andressa Fabiao

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Com que língua eu vou?


Esse artigo não tem o objetivo de defender uma língua portuguesa pautada apenas nas regras gramaticais e nem tampouco desprezá-las. Tem a finalidade de refletirmos até que ponto a norma padrão é considerada como uma ferramenta da escrita em nosso dia-a-dia e em que aspecto ela é descabida.

Assim como a ocasião determina o modo de vestirmos determinada roupa, a nossa linguagem também necessita de algumas “vestimentas” para se adequar à situação “comunicacional”*. Ora, se vou à praia, uso biquíni/maiô, se a um casamento, uso uma roupa fina, se ao mercado da Torre, short, argolas e sandálias havaianas.
Desse mesmo modo, a linguagem falada ou escrita segue essa linha de raciocínio: a adequação.
Por exemplo: não dá para chegar em uma padaria e soltar a mais ortodoxa frase: “Dê- me 2 reais de pães franceses.” Isso soaria como uma expressão típica daqueles que têm necessidade de expor seus conhecimentos formais. O padeiro, certamente, ficará com receio de responder, com medo de se pronunciar incorretamente, e você corre o risco de não ser bem interpretado.
Oswaldo de Andrade, poeta brasileiro, já debochava desse abuso formal, num verso famosíssimo de um de seus poemas, “Pronominais”:
“Dê-me um cigarro, diz a gramática do professor e do aluno...” Ao final do poema, ele rebate criticamente: "... Mas o bom negro e o bom branco da nação brasileira dizem todos os dias: Deixa disso camarada, me dá um cigarro.”
Eis uma regra da gramática: colocação pronominal, ou seja, onde o pronome oblíquo deve ser grafado “corretamente”. Ninguém fala “ler-te-ei no site ParlamentoPb”.
O português brasileiro, dificilmente, respeita essa particularidade da língua formal: muito pouco usada na escrita, e nenhum uso na fala. Mas, insistimos em segui-la por um simples capricho do padrão. Aplausos para os dominantes, para os prosadores antigos, trovadores, filósofos tradicionais, retóricos e literatos arcaicos!
Atualmente, o nosso mérito, enquanto falantes da Língua Portuguesa, equivale à compreensão e domínio das variantes lingüísticas, tanto da linguagem oral, como da escrita; ou seja, usá-las equilibradamente. Evanildo Bechara, grande referência linguístico-gramatical do Brasil, disse “É preciso ser poliglota do seu próprio idioma”; expondo claramente sua defesa pelo uso adequado das variantes linguísticas.
As leis determinadas pela gramática são exigidas em algumas situações da escrita, diferentemente das situações de informalidade, que requerem uma linguagem mais objetiva, que facilite a comunicação entre os usuários da língua, como ocorre no internetês e nas mensagens eletrônicas, entre outros recursos modernos. Absurdo? E o que podemos dizer, então, daquela estranha linguagem utilizada nos antigos telegramas? Enfim, eram utilizados também por “gramatiqueiros”, esses que tanto defendem a ditadura gramatical. É necessário que aprendamos essas regras, sim, para escrevermos um oficio, um artigo de opinião, um discurso político, uma carta formal, etc., mas não devemos ser reféns desses manuais preestabelecidos e fechados. A linguagem é um sistema aberto, dinâmico, onde todos os dias surgem os neologismos, novas gírias, novos códigos e signos.
Marcos Bagno - grande linguista brasileiro – considera, em dimensões, a linguagem como um vasto deserto, e a gramática como um pequeno oásis.
Então, por que devemos considerar as marcas linguísticas formais como sendo as únicas corretas e que merecem prestigio?
Afinal, quem surgiu primeiro, a linguagem humana ou a gramática?
O nóis vai é uma expressão oralmente correta, se considerarmos “as regras gramaticais” dos sertões da vida, por isso devemos respeitar o modo de falar brasileiro, pois nesse país existem muitos dialetos espalhados, cujo objetivo é nos levar a um único lugar; ao entendimento das coisas, a partir de um fundamento humano: a comunicação.

*neologismo criado especialmente para o texto.

O lado oculto da sala de aula

Em sala de aula fiz uma atividade cujo objetivo foi o de conhecer, a partir da autobiografia, os outros universos pelos quais habitam meus alunos, e, obviamente, aproximar-me deles.
Fui objetiva ao elaborar o enunciado da questão: “Produza um texto no qual você narre sua história de vida. Lembrem-se: esse gênero textual (autobiografia) exige o uso da norma padrão.” Entreguei-lhes as folhas de redação, e revisei a estrutura do texto para que eles pudessem refrescar a memória.
Tempos depois, um silêncio absoluto passou a reger os resmungos do ar condicionado. Cada um que voltasse os olhos para dentro de si com intuito de resgatar, no seu íntimo, seus momentos de vida. De repente, como diria o velho e bom Machado de Assis, a pena da galhofa ou da tristeza começara a agir. Borracha vai-e-vem, pinceladas de corretivo para cá, para lá, expressões faciais questionadoras de si mesmas e uns ruídos de lápis grafite que, ora dançava um miudinho, ora dançava um tango.
Primeira redação concluída. Olhei-a, li, reli, retirei as prolixidades, ambiguidades, erros ortográficos, etc.
Quando um primeiro aluno entrega o exercício, parece que os outros não querem “perder a corrida”, pois quanto mais rápido, mais eficiente parece ser a caneta! Próxima redação: mesma rotina; mais outra, idem... enfim. Fui tomar um cafezinho para degustar cada vida exposta no papel. Retornei ao pacote de redações, e sorteei mais uma para minha avaliação.Fitei-a. Estava escrito:

“ Meu nome é B. , tenho10 anos. Sou uma pessoa não muito feliz, pois algo muito forte marcou minha vida. Hoje, moro com minha tia, graças a ela, posso estudar nesta escola. Cuido dos meus primos e dos meus irmãos, às vezes, estudo quando tem tarefa para fazer.
Mas, o que eu queria dizer aqui nessa redação é que eu não tenho mãe, e sou triste por isso. Quando eu era menor, vi meu pai assassinando minha mãe, porque ela não queria mais ficar com ele, vi muitas brigas dos dois e a gente chorava muito. Foi difícil para mim, até hoje penso nela (...). Hoje moro com minha tia e sou feliz por ela ter nos acolhido. (...) Penso que se minha mãe tivesse viva eu seria a filha que mais ama a mãe no mundo (...).

Aquilo soou como um desafino para as batidas do meu coração. Fiquei com um gosto amargo na boca e algumas lágrimas descontroladas surgiram. Disfarcei. Olhei para a autora do texto e percebi que o brilho de seus olhos eram duvidosos de fato.
A ética profissional, a didática, as atividades formais, tudo o que aprendi foi pelo ralo do banheiro, e percebi que nessa situação era preciso um ser mais humano do que uma professorinha que detecta erros gramaticais. Não havia erros ortográficos naquela redação que eu pudesse enxergar, nem tão pouco, pleonasmo, eco, queismo, cacofonia. A única incoerência que percebi foi a maldade daquele pai.
O meu questionamento é:
Até que ponto os currículos presentes nos cursos de graduação compreendem esses problemas? Quanta fragilidade ainda temos para enfrentar situações limite!
Se existem fórmulas para o tecnicismo, hão de existir soluções para o intersubjetivo. A formação técnica pressupõe também a subjetividade. Quando foi que nós pagamos alguma disciplina chamada “educação e alteridade I e II”, “educação emocional I e II ”, “ autogestão I e II”, “ epistemologia do outro e do eu I, II, III e IV” ? Aprendemos “Política nacional da educação básica”,“ Educação e gestão”, “ Filosofia I e II” “ Epistemologia da educação”, etc. Esses conteúdos são importantes para nos conferir status de doutores, mestres, nos proporcionam bens materiais, cartões de crédito, uma profissão, viagens, criticidade, saberes formais, técnicos, enfim.
Por qual motivo nunca aprendemos no primário, hoje educação infantil, a matemática da relação humana, ou história do amor, gramática da boa vontade, geografia do servir? Já que isso é tão inerente ao ser humano?!
As leis educacionais estão muito mais preocupadas com o contexto histórico-social do aluno, com a estrutura, currículos, gestões, evasão escolar, entretanto, nenhum parágrafo voltado para garantir os reparos emocionais que os nossos alunos vivem. Precisamos rever essas leis para que os currículos dos cursos superiores construam práticas para nos ajudar a resolver essas pluralidades.
Finalmente, corrigi as redações, chamei a menina que produzira o texto e pedi sua autorização para ler sua vida em voz alta. Ela aceitou, então pedi atenção dos alunos, disfarcei novamente lendo uma ou outra redação e cheguei “àquela”. A turma silenciou ouvindo atentamente. Após o término da leitura, comovidos, solidarizaram-se com a menina e abraçaram-na chorando, dizendo que ali, em sala de aula, tinha uma família com a qual ela podia contar para sempre. E eu falei: gostaria de ser sua mãe para acabar com essa tristeza do seu rosto, porém como não posso, aqui existe uma professora-amiga.
Eis o lado oculto das salas de aula.